A necessidade de ter uma identidade
Na década de 90, a quantidade de boy e girl bands era assustadora. Uma nova aparecia todos os dias, muitas das quais nem chegaram no Brasil ou ficaram conhecidas fora de seu país de origem, mas até mesmo o Brasil tentou as suas próprias. E a estratégia delas era muito simples, explorava uma característica do relacionamento com os fãs adolescentes.
Eram geralmente cinco cantores, ou cantoras, num grupo que simulava um círculo social de amigos, sendo que cada um representava uma personalidade. No caso da Girl Band, tinha uma que tinha o temperamento mais áspero, uma com personalidade mais suave, uma que era mais séria e responsável, como uma irmã mais velha, uma que era mais brincalhona, e assim por diante. Cada uma representava um tipo de personalidade adolescente, com a qual o fã podia se identificar. A chave do sucesso era atrair o maior público possível, e para isso, era necessário que tivesse uma boa variedade de personalidades, para representar o maior número de adolescentes possíveis.
No caso das boy bands era a mesma coisa, mas como o público musical nessa idade geralmente é majoritariamente feminino, o propósito da boy band era geralmente apaixonar as moças, então também tinha que ter um para cada gosto.
Essa ideia funcionou e funciona até hoje, por que a cultura se apropria de uma das maiores características do ser humano: sentimos necessidade de nos identificar.
Pense sobre isso, a necessidade de se identificar é tão grande, que ela muitas vezes nos governa. Assim como eu, vocês talvez conheçam alguém que tenha muito menos fidelidade com seus cônjuges, amigos ou familiares do que com seus times de futebol, religião, partido político etc... Já se perguntaram por que?
Isso talvez se dê pelo fato de o ser humano ser um animal sociável. Ou seja, um indivíduo não é ninguém sozinho, ele precisa de um círculo social ao qual pertencer, para que se alguém perguntar quem é, ele possa dar uma resposta definitiva e forte.
E isso não é de hoje. Ao longo da história, se perguntasse alguém quem ele era, ele responderia o nome e a cidade de onde vem, em outros, ele responderia o nome, e a profissão. Inclusive muitos dos sobrenomes levam nomes de profissão até hoje por conta disso, famílias inteiras que passavam a função de pai para filho.
Isso explica também atitudes que algumas vezes são até inconscientes, como a xenofobia. Pense em uma pessoa que vivia em uma cidade, onde todos compartilham sua cultura, sua forma de falar, sua forma de vestir, suas crenças. E de um momento para o outro diariamente, grandes quantidades de pessoas com crenças, formas de falar, cultura diferentes começam a chegar em sua cidade. Essas pessoas se instalam, arrumam empregos, criam seus filhos e as espalham sua cultura onde já havia uma cultura. A pessoa nesse exemplo fica assustada, acreditando que aquilo no que ela se baseava logo desaparecerá.
É claro que não estamos defendendo a xenofobia. Aqui nós acreditamos que é muito mais fácil resolver um problema compreendendo do que o julgando. A maioria de nós para admitir que as culturas não somem, que elas absorvem características umas das outras, se assimilam.
E essa mecânica serve para a maioria dos tipos de preconceito, se parar para pensar. As pessoas pensam: “De que vale o trabalho que eu tive para ser quem eu sou, se a partir de agora, esse outro também será aceito?”
Então como instinto de defesa, a pessoa preconceituosa luta para que aquilo não seja aceito mais.
Se você parar para pensar, a identidade não costuma ser muito conservadora. E nós percebemos isso principalmente hoje em dia, quando novas tendências culturais aparecem quase que diariamente, e nós julgamos cada uma várias vezes antes de tentar nos identificar com elas. O nosso instinto inicial é se separar, na maioria das vezes. Nós evitamos aderir a essas novas culturas até que elas sejam gradualmente absorvida pela sociedade a nossa volta, e assim, quando finalmente aderimos, já não estamos mais saindo do nosso círculo social.
A maioria de nós tem a necessidade de julgar, muitos ainda tem preconceitos contra os quais travamos lutas internas para eliminar, por que somos todos sensíveis a necessidade de nos identificar. Você já parou para pensar que, se não precisássemos nos identificar com fatores ou seres externos a nós, talvez fossemos mais felizes?
Talvez fosse a isso que John Lennon falasse em sua música “Imagine”.
Agora o que você me diz, leitor. Olhe para dentro de você e me diga, onde você tenta se identificar? Você ainda tem algum preconceito do qual tenta se livrar aos poucos?
Nenhum comentário:
Postar um comentário